quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A LITERATURA FUTURISTA





A LITERATURA FUTURISTA

O objetivo deste ensaio é analisar a literatura proposta pelo Futurismo Italiano através do Manifesto Técnico da Literatura Futurista publicado por F.T.Marinetti em 1912.

Engana-se quem pensa que o Futurismo foi apenas um movimento literário. O Futurismo não só produziu muitos manifestos em várias áreas estéticas (teatro, pintura, cinema, música, arquitetura), como um controvertido manifesto da religião futurista e até um surpreendente Manifesto do Partido Político Futurista (que desmente a tão falada filiação do movimento ao Fascismo de Mussolini).

A proposta central do Manifesto da Literatura Futurista é a destruição da sintaxe através da técnica denominada por Marinetti de palavras em liberdade que consiste, entre outras coisas, em “colocar os substantivos conforme eles vão nascendo”. Esta técnica revela a influência da “livre associação de idéias” da Psicanálise freudiana que muito impressionou os modernistas da época, como pode ser vista na “escrita automática” dos surrealistas.

Marinetti propunha a abolição do adjetivo que, segundo, ele é uma nuance inconcebível para a visão dinâmica, por sugerir pausa, meditação e a abolição do advérbio entendida como uma velha fivela que mantém as palavras unidas, conservando, na frase, uma enfadonha seriedade de tom.

O fundador do Futurismo ainda propôs a eliminação da pontuação por sugerir pausas e a substituição por sinais matemáticos e musicais, antecedendo os concretistas na mescla intersemiótica, ou seja, misturando linguagens de áreas distintas, fundindo o verbal e o não-verbal.

O poeta italiano ensina como se deve fazer a técnica das palavras em liberdade, dizendo que o substantivo deve ter seu duplo, ou seja, seguido sem conjugação. Ex.: homem-torpedeira, mulher-baia. Algo que revela o espírito pragmático e utilitário do time is money , pois a literatura deveria conter, em sua forma e conteúdo, o dinamismo furioso e urgente desse novo tempo. Daí o uso fragmentado e telegráfico da linguagem verbal, tentando imprimir um ritmo mais agitado e violento à leitura, como espelho da realidade frenética do capitalismo urbano e industrial.

As reações às palavras em liberdade foram das mais variadas, mas quase sempre negativas, como a do modernista Mário de Andrade que sentenciou a técnica como

“um meio passageiro de expressão, sendo os trechos de palavras em liberdade intoleráveis de hermetismo, de falsidade e monotonia”.

A técnica torna o texto um aglomerado de palavras soltas e desconexas em que se quebra violentamente com a linearidade da língua, rompendo com o período canônico: sujeito, verbo e complemento. A ousadia não para por aí. Com a colocação de signos não-lingüísticos, recortes de jornal, etc., o texto futurista configura uma das características mais perturbadoras da arte moderna: o hibridismo, ou seja, a ausência de fronteiras visíveis entre a literatura e as artes-plásticas.

Dadas as características, seria difícil classificar o texto futurista na divisão tradicional em prosa ou poesia. Não é poesia, porque rompe com o verso, seja metrificado ou livre e não é prosa porque não forma frases, períodos, parágrafos.

Nessa altura cabe perguntar qual a contribuição do futurismo para a literatura e para as artes do séc. XX ? A contribuição maior do Futurismo foi ter deflagrado o modernismo. Sendo o moderno uma ruptura com a tradição, com o estabelecido, com o cânon; o Futurismo abriu novas perspectivas e novos modos de se pensar, ver e fazer o mundo. Por ser um dos primeiros movimentos de vanguarda, a proposta italiana teve todos os defeitos dos pioneiros: provocação, sectarismo, violência, gratuidades formais (o poema piada, a anedota) e outras frivolidades. Apesar disso, seria difícil imaginar o humor caótico dos dadaístas e a reconstrução onírica da realidade pelos surrealistas ou a ruptura dos limites entre arte e vida dos situacionistas franceses da decada de 60, sem o histrionismo dos seguidores de Marinetti. O Futurismo, ao romper com a lógica tradicional, vai delegar a autores como Fernando Pessoa os momentos mais ricos da poesia ocidental.

Não cabe juízo de valor em relação à qualidade das produções futuristas, mas reconhecer que, a partir delas, o homem ocidental começou a se libertar dos grilhões cartesianos-newtonianos da ciência e da racionalidade burguesa, tornando o existir mais complexo e profundo.

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